Servidão libertadora? 

Uma das doenças mais comuns na nossa era é o Burnout. Aparentemente criado pelos excessos de produção e produtividade que nossa economia, nossa cultura e nossa sociedade requerem.  

As novas gerações Y e Z, diferente de seus pais e avós, buscam tempo de qualidade, trabalhar o mínimo possível para desfrutar ou se desenvolver o máximo possível. Como se o trabalho realmente fosse o contrário do que realmente se quer e se busca. O contrário do que realmente faria sentido, daria prazer ou enriqueceria além do dinheiro. 

O final da parashá Behar estabelece algo muito estranho e até o contraditório: “Por que para mim os filhos de Israel são meus servos que os tirei da escravidão, não pratiquem a venda de pessoas”. 

Surge de imediato a pergunta clássica de qualquer leitor atento e da tradição judaica milenar: Será que Deus libertou o povo para escravizá-lo? Os hebreus saíram de uma servidão apenas para entrar em outra? 

Muitas vezes a relação com o divino realmente parece uma escravidão. Assim como a relação com uma pessoa, com uma dinâmica e com um trabalho e com uma função. 

Todos sabemos que existem trabalhos e atividades que exploram, outros que alienam e outros ainda que ajudam a pessoa a se sentir útil, a desenvolver seus potenciais e a crescer de verdade no seu interior.  

Qual seria o modo de garantir que nossas atividades e relacionamentos sejam libertadores e realizadores do melhor?  

Pirkei avot explica que “não há pessoa mais livre que quem estuda a Torá, entendida, claro, como sabedoria divina, para além do mero texto literal do Pentateuco ou do detalhe de alguma lei ritual.  

Na nossa teologia, especialmente na orientação mística da Kabbalah e do chassidismo clássico, esse “divino” essa sabedoria estaria em tudo e a libertação do melhor do humano se encontra em buscar, reconhecer e conhecer o essencial que se esconde dentro de cada momento, atividade ou pessoa.  

 A alienação ou realização das pessoas, a escravização ou a libertação não se limitaria ao tipo de atividade, mas muito mais ao modo como é realizada, à intenção ao propósito. 

Se conversamos para dizer e terminar, se trabalhamos para sair de férias, se visitamos comemos, lemos, ouvimos para cumprir o dever, fazer check e descansar ou se fazemos tudo isso para encontrar sabedoria divino em tudo. 

O rabino, filósofo e poeta medieval, Rabi Yehuda Halevi, escreveu num poema: os servos do tempo, servos de servos são, mas os servos do divino são sempre livres. 

Que possamos querer encontrar o divino de e em todos e tudo a cada passo e momento, para viver uma vida que sirva o propósito mais libertador: a realização do sentido. 

 Shabat Shalom 

Rab. Dr. Ruben Sternschein