
Na Parashá desta semana, Moshê nos adverte: quando tivermos fartura, belas casas e tudo prosperando, há um perigo real — esquecer de Deus. A Torá descreve esse momento com precisão: “O meu poder e a força da minha mão me trouxeram esta riqueza” (Devarim 8:17).
Mas a tradição nos dá um antídoto poderoso: agradecer.
É daí que nasce o Birkat Hamazon, a bênção após as refeições. Comer é algo tão comum que pode passar despercebido. Mas, ao agradecer a cada vez que nos alimentamos, transformamos o ato mais rotineiro em um encontro com o Sagrado.
Como ensinava o rabino Menachem Mendel de Kotzk, foi assim que Avraham Avinu inspirou fé: recebia convidados, alimentava-os e ao receber elogios e agradecimentos por isso, lembrava seus convidados que ele era apenas um facilitador, mas a fonte de tudo aquilo era Deus.
O Chafetz Chaim conta que uma vez, um homem rico se vangloriou para ele de que Deus lhe havia concedido grande riqueza e que não lhe faltava nada. O sábio respondeu: “Que ótimo! Então você deveria dedicar algumas horas diárias ao estudo da Torá”. Mas o homem que se achava rico, disse que não tinha tempo para isso. Chafetz Chaim então ensina: “Você é o mais pobre dos pobres, porque se o seu tempo não for seu, o que você tem? Não existe pessoa pobre em tempo.”
Reconhecer que nosso sucesso não vem só da nossa inteligência ou esforço, mas também das oportunidades, das pessoas que nos apoiaram, e de Deus que nos deu dons e vida. A ciência e a tecnologia nos mostram conquistas incríveis, mas também nos tentam a acreditar que somos senhores absolutos do nosso destino. A tradição nos lembra: antes de cada mordida, antes de cada conquista, antes de cada decisão — bênção.
Hoje, como comunidade judaica, vivemos um momento de liberdade e prosperidade raros na nossa história. Isso é motivo de alegria — e de responsabilidade. Se reconhecermos a Fonte de tudo, nossa fartura se tornará também fonte de generosidade, aprendizado e união.
Que possamos, juntos, manter viva a prática de agradecer. Não como formalidade, mas como ato de consciência. Porque quando a bênção sai dos lábios, ela entra no coração — e nos conecta com a fonte da vida.
Shabat Shalom!
Rav Natan Freller