Moshé é reconhecido em nossa tradição como nosso mestre, professor, líder do povo. Conhecido por sua humildade, resiliência, e capacidade de escuta. O que mais me fascina na jornada de Moshé como líder é sua autenticidade, um líder que, como qualquer ser humano, comete erros e sofre as consequências causadas por suas atitudes. Nossa maior referência de liderança humana na literatura judaica não é perfeita, e talvez, justamente por isso, seja um exemplo tão relevante para nós. Um líder que aprende com seus próprios erros, que escuta os demais, que admite suas limitações, é um líder muito mais representativo de nossa realidade humana. Através desse prisma, quero convidar você a analisar a parashá dessa semana pela perspectiva de Moshé como líder do povo judeu no deserto, logo após o momento no qual um decreto divino sela o futuro do povo pelos próximos 40 anos.

Além de Moshé, o personagem principal da parashá dessa semana é Côrach, um levita, ou seja, primo distante de Moshé, membro da mesma tribo ancestral. Côrach, junto com seus aliados, confrontam Moshé e Aharon em seus papéis de liderança:

Eles se uniram contra Moshé e Aharon e disseram: “Vocês foram longe demais! Porque toda a comunidade é considerada sagrada, todos eles, e Deus está no meio deles. Por que então vocês se elevam acima da congregação de Deus?” Bamidbar 16:3.

Se você fosse Moshé, o que faria? Como responderia a Côrach? Rabino Shneur Zalman de Liadi, fundador do movimento hassídico Lubavitch (ou Chabad), diz que Moishé caiu de cara no chão porque realmente teve que se perguntar se Côrach tem um argumento válido:

“Teria sido apropriado que Moisés lhe respondesse imediatamente, então por que ele primeiro caiu de cara no chão? Moisés, nosso mestre, teve a sensação de que talvez eles essa questão fosse divina, e Côrach era apenas um mensageiro. Assim, ele primeiro caiu de cara no chão para uma autorreflexão, para ver se na verdade ele tinha alguma arrogância. Depois de se verificar minuciosamente e não encontrar nenhum traço de orgulho, ele entendeu que ele Côrach não era um mensageiro de Deus, mas um divisor de pessoas, e então respondeu como o fez.”

Quando Moshé ouviu isso, ele caiu com o rosto no chão (uma forma ancestral de reza e reflexão). Bamidbar 16:4.

Em seguida, Moshé chama Côrach e seus seguidores para uma apresentação frente a Deus. Moshé não responde de maneira defensiva, não ataca Korach. Moshé escuta a crítica e leva ela até a fonte da resolução, afinal, Moshé disse a Deus no príncipio que não queria estar naquela posição. Deus foi firme com Moshé e o ordenou que se tornasse o líder que o povo precisava, junto a seus irmãos, Aharon e Miriam.

Quando Moshé propõe a Côrach se apresentar diante de Deus, Côrach se recusa. Côrach não aceita a legitimidade de Moshé como líder nem mesmo para resolver o conflito entre eles. Apenas após um segundo chamado com respaldo divino, Korach e seus seguidores se apresentam.

Deus pede a Moshé e Aharon que se afastem de Côrach, pois a punição será severa. Porém, Moshé contesta Deus: Moshé e Aharon novamente se prostraram com o rosto no chão e dizem: “Ó Deus, Fonte da vida! Quando um membro peca, você ficará irado com toda a comunidade?” Bamidbar 16:22.

Deus responde de forma objetiva: “Se afastem deles, e estarão protegidos.”

Por fim, Moshé, Aharon e seus seguidores se afastam e Deus cria uma abertura no chão da Terra que leva Côrach e todos seus seguidores com ele.

Enquanto a muitos desafios no entendimento entre o divino e o humano nessa parashá, quero enfatizar o papel de Moshé como líder nesse momento. A principal crítica de Côrach era contra Moshé e sua liderança. Moshé, em nenhum momento se defende ou se glorifica, mas demonstra sua liderança protegendo a seu irmão, Aharon, e argumentando contra Deus pela proteção de toda a comunidade.

Que nesta semana, possamos aprender com Moshé, nosso mestre, fortalecendo nossa capacidade de escutar, de refletir, de se preocupar com os demais. Todos nós somos líderes em algum momento ou circunstância da vida. Cabe a cada um saber identificar esses momentos, manter a humildade, e não perder a sensibilidade humana.

 

Shabat Shalom,

Rabino Natan Freller