Uma das práticas mais comuns de nossos dias é a do shopping. Refiro-me a sair para comprar, para consumir, não necessariamente e exclusivamente em shoppings centers. Chamamo-nos a era do consumo pois é o que mais fazemos, seja na hora de comprar, de produzir, de vender. Muito, se não tudo, gira em torno desse valor, como se o que temos fosse a chave de tudo.
Existe uma alternativa bem conhecida, embora muitas vezes abandonada: o verbo ser. Embora avaliemos as pessoas muitas vezes pelo que elas têm, o ser independe do ter. De fato, chegamos ao mundo sem nada e saímos dele sem nada além do que somos. A única coisa que realmente está sempre conosco e permanece vinculada a nós, inclusive quando nos vamos do mundo, é o que somos. Paradoxalmente o que única e realmente possuímos é aquilo que somos, o nosso ser. Em outras palavras: não somos o que temos, e só temos de verdade o que somos. Tudo o mais não adquirimos realmente, e, por isso, acabamos o deixando quando nos vamos.
As parashiót da semana nos lembram disso de forma clara. Em uma era agrícola, na qual todos possuíam terras e as trabalhavam para seu sustento como modo de vida, nos foi dito que a terra deveria descansar. Ela tem shabat também. Mais ainda: as leis relativas ao ano sabático e ao jubileu terminam com a cláusula: “…e a terra não será vendida para sempre, pois minha é a terra (diz Deus), e vocês são estrangeiros passageiros”. A terra, como todos os bens, não nos pertencem. Só passamos temporariamente por eles. Eles permanecem, antes e depois de nós. Nós perecemos.
Na descrição dessas leis aparece a palavra dror, que significa duas coisas: liberdade e também o nome de um dos pássaros mais simples e comuns da região. Os comentaristas explicaram que o hebraico escolheu esse pássaro como figura da liberdade pois ele mora tanto na casa como no campo, ou seja: faz de qualquer local seu habitat, é em todo lado e situação ele mesmo. Como se a liberdade estivesse atrelada à autenticidade. Livre é quem consegue ser autêntico em toda situação. Ele. Não seus bens passageiros.
Que possamos identificar nossa verdadeira identidade, abraçá-la e desenvolvê-la com autenticidade, além dos bens passageiros que posamos vir a consumir, dando conta de que apenas possuímos quem somos.
Shabat Shalom.
Rabino Ruben Sternschein