
Na parashá desta semana encontramos uma mitzvá curiosa e aparentemente pequena: “Se, ao longo do caminho, você encontrar um ninho de pássaro, em qualquer árvore ou no chão, com filhotes ou ovos, e a mãe sentada sobre os filhotes ou sobre os ovos, não leve a mãe com seus filhotes. Deixe a mãe ir e leve apenas os filhotes, para que você tenha saúde e vida longa.” (Devarim 22:6–7).
Ramban nos ensina: a finalidade aqui não é apenas preservar espécies, mas refinar o coração humano, para que não nos tornemos cruéis. A Torá treina nossa sensibilidade através de atos concretos.
E aqui está um ponto essencial: nem todas as mitzvot têm aplicação prática evidente. Muitas vezes não sabemos exatamente “para que servem” ou “por que foram ordenadas”. Mas o que todas têm em comum é seu trabalho silencioso sobre nossas midot – nossas características da alma, nossos valores, a forma como reagimos e sentimos. Cumprir uma mitzvá é como exercitar um músculo: molda a pessoa por dentro, até que a compaixão, a humildade ou a disciplina passem a habitar naturalmente em nós.
Essa atitude perante a mãe pássaro nos ensina que mesmo quando não vemos imediatamente a utilidade prática de um mandamento, ele nos treina a olhar para a vida com mais cuidado, a não nos endurecemos diante da dor do outro, seja humano ou animal.
Estamos às portas de Rosh Hashaná e Iom Kipur – dias em que olhamos para dentro e perguntamos: quem estou me tornando? As mitzvot são justamente a ferramenta que a Torá nos oferece para esta transformação. Cada ato – pequeno ou grande – é uma oportunidade de trabalhar nossas midot, de refinar nossa sensibilidade, de alinhar nosso ser com o bem.
Assim, a pergunta central das Grandes Festas não é apenas “o que eu fiz?”, mas também “em que tipo de pessoa cada ato me transformou?”. Pois a Torá não deseja apenas que façamos coisas corretas, mas que nos tornemos pessoas melhores.
Que este Elul e o novo ano sejam um exercício constante de mitzvot que tocam e lapidam nossa alma, para que possamos entrar em Rosh Hashaná e Iom Kipur com o coração mais leve, compassivo e aberto à vida.
Shabat Shalom
Rav Natan Freller