Qual será a razão da centralidade e da fama que o “Shema Israel” alcançou? O Shema é a frase com a qual vamos dormir, repetimos duas vezes por dia, no Shabat e nas festas, mais uma vez diante da Torá e outra vez no serviço de Mussaf. É a frase com a qual as pessoas que conseguem se despedem do mundo e, especialmente, os mártires mencionam ou até gritam em seu último suspiro. É a frase que algumas pessoas instintivamente pronunciam diante do desespero, do perigo, da incerteza ou da salvação de uma dessas situações.
Por quê? Qual dos conteúdos nela mencionados contém esse poder?
A frase aparece na parashá desta semana. Antes dela, fala-se do contexto da entrega dos Dez Mandamentos. Depois dela, continua-se com o resumo das experiências históricas e educativas prévias à entrada na Terra de Israel e à despedida de Moisés. Nesse contexto, a frase poderia ser vista como mais uma recomendação.
O conteúdo explícito é conhecido: a unicidade de Deus, nomeado ao mesmo tempo como Deus geral e como nosso Deus, e o amor que deve implicar a totalidade do ser. Lembra, em seguida, que os princípios e valores devem ser transmitidos aos filhos em todas as situações: na tranquilidade do lar, nas mudanças de caminhos, ao deitar e ao acordar — o que poderia indicar, novamente, o conforto do conhecido em contraposição ao despertar para novas circunstâncias, ou talvez indicar a situação do fim de uma vida e o começo de outras. Eles devem ser amarrados aos braços, indicando a importância de sua materialização em ações concretas, e devem ser um estandarte entre nossos olhos, representando a inspiração da mente que influencia nossa visão. Devem ser colocados nos batentes das casas, ou seja, no limite entre o privado e o público, buscando coerência entre os princípios, valores e modos que aplicamos a nós mesmos e aos nossos próximos, por um lado, e aos alheios, por outro. Se formos melhores fora de casa, deveríamos trazer esses padrões para dentro e vice-versa. Estas últimas duas linhas são as que deram origem aos tefilin e à mezuzá.
Maimônides disse que o Shema expressa que todos e tudo viemos de uma mesma origem. Rashi disse que todos e tudo, um dia, reconhecerão essa afinidade e, portanto, o Shema é uma declaração de esperança na paz.
Permito-me acrescentar, com humildade, que trata-se de um desafio: encontrar a unidade por trás das diferenças, tanto dentro de cada um quanto no mundo ao redor. As diferenças entre o que pensamos, sentimos e fazemos devem buscar coerência, assim como as diferenças entre o interior do lar e da família em comparação com a sociedade e o mundo maior fora. A diversidade pode harmonizar; a unidade é diversa e ampla. Talvez sejam esses valores e ideais, ainda não (e talvez nunca) totalmente alcançados, que conferiram ao Shema seu destaque.
Shabat shalom,
Rab. Dr. Ruben Sternschein