A força de uma comunidade

O Grande Templo de Jerusalém foi idealizado para ser o ponto de unificação entre todas as tribos e a centralidade de toda terra de Israel. De alguma maneira estaríamos retomando a coesão que o Mishcán, o Tabernáculo móvel que acompanhou o povo ao longo dos quarenta anos no deserto, promovia na jornada do povo caminhando junto dia e noite sob a liderança de Moshé.
Quando a cidade de Jerusalém foi instituída como capital do reino de David e o grande Templo construído no reinado de seu filho Shlomo, todos os pequenos altares de culto espalhados pelo território foram abolidos. Desde que atravessaram o Jordão e se instalaram na Terra Prometida, as várias tribos tinham seus lugares de sacrifícios. Os cohanim e leviim (sacerdotes e levitas) estavam espalhados por todo o território para serem a ponte entre as “pessoas comuns” e Deus.
Mais de uma vez lemos na Torá que devemos garantir que, uma vez entrado na Terra, destruiremos tudo o que remetesse ao culto pagão dos povos locais. Deveríamos destruir os altares, as árvores de adoração, até cidades inteiras. Somos proibidos explicitamente de perguntar sobre o que e como faziam os cultos. Os sacrifícios a Deus, detalhadamente descritos no livro de Vaicrá, deveriam acontecer somente nos lugares designados por Deus (instrução que se repete algumas vezes em nossa parashá).
Os sacrifícios tinham diferentes funções: agradecer, pedir perdão, oferecer doações voluntárias e obrigatórias (os dízimos, por exemplo). Cada uma delas pode ser pensada como algo íntimo e individual. Algumas podem trazer vergonha e outras serem extremamente “burocráticas”, mas, são a essência de uma comunidade. Podemos festejar privadamente ou sofrer afastados dos outros, mas isso nos exclui da humanidade.
Os seres humanos são, em sua essência, seres coletivos. Para isso devemos partilhar nossos momentos de alegrias e angústias, aqueles vergonhosos e os de orgulho. Inclusive os burocráticos têm uma função social de manutenção das organizações.
O grande desafio é fazer com que todos se sintam partícipes o suficiente para querer partilhar do seu privado com o coletivo e contribuir para que o espaço coletivo exista, fazendo com que outras pessoas possam também partilhar os seus momentos mais diversos.
Muitas vezes não nos sentimos diretamente representados pelas instituições, ou nos afastamos por discordarmos de uma ou outra prática ou ideia. E é no afastamento que ficamos cada vez mais longe de termos um lugar que nos represente.
Quando a Torá nos diz que Deus escolherá um lugar dentre as tribos, os sábios diretamente relacionaram esse lugar com Jerusalém, cidade dentro da tribo de Biniamin. Porém, como fazer com que todos os das outras tribos se sintam representados nesse lugar, talvez tão distante fisicamente de onde moravam? Um midrash nos conta que cada tribo contribuiu para juntar o dinheiro necessário para adquirir a terra para a construção do Templo, assim eram donos de pelo menos uma parte. E ser dono de uma parte te dá o direito de participar, de opinar, de querer, de gostar, de discordar…
Que escutemos essa mensagem que a Torá nos clama diversas vezes, de que devemos ter algum lugar como ponto central, ponto de reunião, para podermos ser “seres humanos” e viver em comunidade. Para que sempre tenhamos um lugar para chamar de nosso, que esteja por nós quando precisarmos e que possamos estar para quando os outros precisarem de nós.

Shabat Shalom
rabina Fernanda Tomchinsky-Galanternik