Algumas vezes pecamos por excesso de ausência, outras por excesso de presença. Algumas por excesso de ação e outras por excesso de omissão.

Qual é a medida certa? Existe algum parâmetro?

A pergunta se aplica a relações de trabalho, de família e nas relações conjugais. Na educação alguns defendem pedagogias que explicam mais, outras preferem deixar mais livre o aluno       “se virar”. Umas teorias e escolas pregam ter um programa de conteúdos mais pautado, outras  mais aberto e eletivo.

Parcerias entre empresas enfrentam esse desafio e também a medicina: existem médicos que preferem deixar o corpo agir o máximo possível e outros que defendem a maior ajuda e cuidado por meios externos.

A pergunta de maior ou menor intervenção se aplica na economia: políticas de maior intervenção que dizem ajudar assim os mais fracos e cuidar da responsabilidade social e outras de menor intervenção que dizem defender a liberdade e evitar a corrupção.

A parashá da semana, Pecudei, termina uma série de quatro parashiot dedicadas a um projeto estranho: a construção do tabernáculo, através do qual Deus moraria entre as pessoas.

Alguns acreditam que só poderia ser uma metáfora, pois Deus, sendo incorpóreo e onipresente não precisaria de um local para habitar, e sendo onipotente não precisaria de nada que não possa por si próprio. Entretanto, a vontade humana de sermos habitados pela presença divina sim estaria apenas nas nossas mãos e a expressão da abertura dela poderia sim ser a construção do espaço dedicado ao encontro de nossa existência física com a divindade. O tabernáculo não seria tanto um local como sim uma disposição.

De todo modo, em longos textos as primeiras duas parashiot detalham as orientações divinas e ao longo de toda a parashá passada e grande parte desta é relatada a execução. Um detalhe chama a atenção nestas últimas duas: Deus deixa de intervir.

Só nos é relatado o que os humanos fizeram. Em detalhe. A arquitetura, a arte, a confecção das roupas dos sacerdotes para cada tarefa e dos utensílios específicos. Deus aparece somente uma vez que toda a tarefa humana foi concluída e sua presença acolhe a construção e se deixa acolher por ela, habitando nela.

Outro detalhe chama a atenção: embora toda a ação foi feita como foi determinada nas primeiras duas parashiot, a ordem mudou. Os executores aplicaram critérios próprios.

Por fim, o terceiro detalhe que chama a atenção, é a mistura do plural e do singular na execução e na conclusão: às vezes parece que apenas um protagonista está agindo (Deus? Um líder? Um artista?) outras um coletivo.

Os três detalhes poderiam se explicar em resposta à nossa pergunta inicial: Trata-se de um projeto com planejamento e espaço para a liberdade individual de expressão criativa e realização pessoal. Orientações são dadas, mas na hora da execução o silêncio liberta. Embora crie um risco que não será revelado até a aprovação final, garante a presença individual de quem executa também. Talvez era isso que precisava a divindade para poder habitar a humanidade: orientar e deixar espaço ao mesmo tempo.

Que possamos aprender e aplicar nossas situações humanas, sociais, comerciais, físicas e pessoais.

 

Shabat shalom,

Rabino Dr. Ruben Sternschein