Do Rabino Dow Marmur z’l, aprendi que as decisões comunitárias devem ser sempre tomadas em benefício do coletivo e não do indivíduo. Quando pensamos em mudanças que devem ser feitas, quando questionamos práticas ou decisões que terão impacto no espaço compartilhado por todos nós, é importante avaliar se o interesse, o benefício, será só de uma pessoa, ou da “comum-unidade” que juntos formamos.

Na parashá desta semana, Machlá, Noá, Chogla, Milcá e Tirtsá (todos nomes hebraicos conectados com movimento), filhas de Tselofechad, alçaram sua voz para mudar uma injusta tradição. “Elas se puseram diante de Moshé, de Eleazar o sacerdote, dos chefes e de toda a Assembleia, à entrada da Tenda de Reunião e disseram: ‘Nosso pai morreu no deserto. Ele não era parte da facção, a facção de Korach, que se uniu contra o Eterno, mas morreu por seu próprio pecado, e ele não deixou filhos. Que o nome do nosso pai não seja perdido para o seu clã somente porque não teve nenhum filho! De-nos uma posse entre os parentes de nosso pai’. Moshé levou o caso delas diante do Eterno, e o Eterno disse a Moshé: ‘A demanda das filhas de Tselofehad é justa, vocês lhes darão uma posse hereditária entre os parentes de seu pai, transfira a porção do seu pai para elas. Além disso, diga o seguinte para o povo israelita: ‘Se um proprietário morrer sem deixar filho, transfiram sua propriedade a sua filha’” (Num 27:2-8)

Muita coisa tem sido escrita sobre as filhas de Tselofechad: a força de não se conformar com uma situação injusta, a coragem de se posicionar frente à liderança do povo sendo elas modelo para as gerações, se aproximar de espaços que eram proibidos para mulheres, não deixar de se posicionar pelo que elas acreditavam. Deus não só acha o pedido delas justo, mas entende que não será só um caso particular que beneficiará essas cinco irmãs senão que se tornará lei.

Embora gostaria que este fosse o final da história e que aquilo que Deus falou para Moshé ficasse como lei e como ensinamento de geração em geração, no final do livro de Bamidbar os homens estabeleceram uma condição para as mulheres que herdaram terras de seu pai. “Agora, se elas se casarem com pessoas de outra tribo israelita, a parte delas será cortada de nossa porção ancestral e somada à porção da tribo em que se casarem, assim a nossa porção designada será diminuída” (Num 36:3) As filhas de Tselofechad foram obrigadas a se casar com homens da sua tribo e suas terras foram transferidas a seus maridos. A pedido dos homens da tribo e sem Moshé precisar consultar a Deus.

A luta começou há mais de 3000 anos e ainda é relevante. A equidade, a igualdade de direitos entre homens e mulheres não é aceita nem respeitada como deveria. Já tivemos grandes avanços, mas o caminho ainda é longo. Nesta semana que termina, no Brasil foi sancionada uma lei que tem o objetivo de assegurar a igualdade salarial entre homens e mulheres que desempenhem a mesma função. A medida também estabelece que, em caso de discriminação por gênero, raça ou etnia, o empregador deverá pagar multas. Além disso, os empregadores também deverão disponibilizar canais de denúncias e promover programas de inclusão e capacitação de mulheres no mercado de trabalho.

Na quarta Conferência da Mulher organizada pela ONU em Beijing, a então primeira dama dos Estados Unidos Hillary Clinton diz na sua apresentação: “…não é mais aceitável discutir os direitos das mulheres separadamente dos direitos humanos… Os direitos humanos são das mulheres e os direitos das mulheres são direitos humanos… As mulheres devem gozar do direito de participar plenamente na vida social e política de seus países, se querem que a liberdade e a democracia prosperem e durem.”

Que sejamos parceiros nas mudanças que devem acontecer em nossa comunidade, em nosso povo e em nossa sociedade pelo bem do coletivo.

 

Shabat Shalom,

Rabina Tamara Schagas