Os tribunais rabínicos convencionais, integrados somente por homens, na sua ampla maioria da linha ultraortodoxa, são conhecidos por favorecer geralmente os homens, especialmente em disputas de divórcio.
 

Costumamos assumir que essa tendência machista faz parte do passado, da tradição, para bem ou para mal. Será? Realmente o judaísmo pregou esse machismo na justiça?  Sempre? Em todos os casos, em todas as épocas do nosso longo passado antes da modernidade? Será que buscar um lugar digno e justo para os direitos da mulher na vida civil é só uma tendência moderna?

 

Na parashá da semana, aparece o mandamento de constituir tribunais e nominar juízes nas seguintes palavras: “procurem pessoas sabias, entendedoras e conhecidas e os colocarei como juízes”.

 

A palavra pessoas “anashim”, é o plural da palavra ish, que significa homem. Numa passagem do midrash, que comenta este versículo uns 2000 anos depois, diz um rabino: a alguém ocorre que possa ser uma mulher?!

 

Dele entendemos que, naquele contexto, era óbvio que essas funções eram masculinas e várias fontes o fundamentam.

 

Todavia, outras fontes da época e posteriores enfatizam o contrário: o fato de que ainda na Bíblia, Deborah é uma juíza, considerada também profetisa, e o povo todo a procura para se aconselhar e julgar em todo tipo de tema. Outros midrashim da mesma época mostram exemplos de bases para juízas mulheres, como o Eclesiastes, por exemplo.

 

Bem antes, durante e depois dessa fonte citada acima, que deu por óbvio que só homens poderiam julgar, temos muitas provas de que havia posições e práticas opostas, que viam a possibilidade de juízas mulheres como algo natural ou que, no mínimo, a limitação não viria de algo biológico, do corpo da mulher, e sim de seu injusto lugar social inferior. Ou seja, a mulher não poderia julgar pela inferioridade social que impediria o reconhecimento para exercer esse poder. Assim, a pergunta aparentemente era: perpetuar essa situação injusta, impedindo juízas mulheres, ou revertê-la empoderando-as?

 

Nos últimos anos em Israel, vem se desenvolvendo, inclusive nesses fóruns ultraortodoxos acima mencionados, a figura de “assessora de assuntos femininos”. Trata-se de uma mulher ortodoxa também, que se forma diligentemente na lei judaica e participa dos julgamentos, numa cadeira mais baixa, do lado do tribunal. (Ethel Katz Barilka, ex-colega minha no Machon lemadrichim e ex-shlicha da chazit na CIP é uma delas).

 

No universo liberal, as mulheres podem testemunhar e julgar sem diferenças há muito tempo.

 

Sabemos que esse status igualitário existiu há séculos, muito antes dos machismos medievais e atuais. Por isso, devemos fortalecer nossas tentativas de fazer jus na justiça judaica.

 
 

Shabat Shalom.
Rabino Ruben Sternschein