Individuo e Coletivo – Quem serve a quem?

53618835 – contempt toward unique ones, being different, weird, surrounded by adversity, judging the odd one, wood pencils on desk

A relação entre o indivíduo e o coletivo tem apresentado principalmente dois grandes modelos. Aquele que diz que o indivíduo é, antes e depois de tudo, uma pequena unidade de um todo muito maior e aquele que sustenta o contrário, que os coletivos existem para desenvolver os indivíduos.
Sistemas de governo devem administrar a economia, a segurança, a educação, a cultura, para permitir que os indivíduos das sociedades que lideram consigam se desenvolver da melhor forma. Para si próprios. Não para promover um bem comum que erradamente se chamaria de “bem maior”. Pelo contrário. Não existiria maior bem que a realização mais plena de cada indivíduo ou a felicidade de cada ser. O acerto de uma cultura, de um valor, de uma religião, de um modo de educação, de uma economia ou de um sistema político medir-se-ia de acordo com o grau de felicidade ou realização pessoal de seus indivíduos.
Já o primeiro modelo, diria que cada indivíduo é um pequeno detalhe finito, temporal da imensidão do tempo e do espaço, da história e da natureza. Ele se vê erradamente como o centro de tudo, mas seu passo por ambos é apenas um mero detalhe. A história, como uma cultura, uma religião ou uma filosofia seriam avaliadas em função do grau de evolução que permitem a suas sociedades e grupos, e ao mundo. A eficiência da educação ou da economia se mediria em virtude da formação de indivíduos que perpetuem, promovam e evoluam o coletivo. O bem, o justo, e o próprio Deus seriam caracterizados pelo geral. Guerras mundiais, catástrofes massivas poderiam ser vistas como preços necessários e justificados se o coletivo, o mundo, conseguiu progredir graças a elas.
Os grandes pensadores do racionalismo e do idealismo, sejam eles judeus como Maimônides ou Spinoza, ou não como Platão, Aristóteles ou Kant, apoiavam o primeiro modelo. Também as ideologias extremas de direita como de esquerda promoviam o bem internacional ou o nacional por cima de tudo.
Os liberalismos econômicos ou políticos, e os pensadores existencialistas judeus ou não estariam mais perto do segundo modelo.
A parasha da semana parece propor um modelo intermediário. Prestes a entrarem na terra prometida duas tribos e meia pedem para ficar no caminho em virtude das condições favoráveis da terra na qual se encontram, para seu gado. Moises aceita o pedido e inclusive a justificativa materialista e individualista mas reclama ao mesmo tempo pela responsabilidade coletiva: “seus irmãos sairão à luta pela conquista da nossa terra comum e vocês ficarão sentados aqui com seus gados?”
A solução resulta em que eles povoarão a terra de sua conveniência, mas acompanharão o coletivo na sua luta. Só uma vez que todas as tribos conseguirem se instalar nas suas respectivas parcelas da terra prometida, eles voltariam a seus territórios pré-escolhidos fora dela.
Talvez o bem comum seja o bem individual e vice-versa. Talvez apenas uma sociedade que prioriza a unicidade de seus indivíduos seja digna de indivíduos que se entreguem também a sua realização plena. E vice-versa. Somente indivíduos dispostos a ver o bem comum como um grande ideal, além de suas vidas finitas, seriam dignos de um sistema coletivo que os promova individualmente. Talvez a realização do coletivo so seja possível na dos seus indivíduos e a dos indivíduos na projeção do coletivo.
Shabat shalom
Rabino. Dr. Ruben Sternschein