Esta semana, lemos duas parashiot da Torá – Acharei Mot e Kedoshim.

É impressionante que a parashá Kedoshim apareça neste livro. Ela chama a atenção porque não se parece em nada com o estilo do Sefer Vaicrá, o livro de Levítico. Não é um texto composto apenas por instruções sacrificiais, nem direcionado apenas aos cohanim (sacerdotes), mas a todo o povo – ao contrário do restante do livro.

Uma das possíveis interpretações para a sequência Acharei Mot-Kedoshim é que, após o rito expiatório do Iom Kipur, a Torá nos convida a continuar neste estado de santidade. A ideia é que, após a expiação coletiva, um desafio divino nos é oferecido: “sejam kedoshim, pois eu sou kadosh” (Vaicrá 19:2). Mas o que é kedushá? Entre os significados mais profundos da palavra hebraica, a tradução mais comum em português é “santidade”. Porém ao traduzir dessa maneira, perdemos parte de seu significado original – ser kadosh significa estar separado de algo. Diferente. Especial, mas não necessariamente melhor.

O judaísmo não é um modo de vida para ser vivido sozinho. O judaísmo é uma maneira de trazer a santidade divina ao mundo, responsabilizando-nos mutuamente por nossos desafios e responsabilidades morais e sociais. Todas as nossas decisões e comportamentos refletem essa santidade. A maneira como nos relacionamos em casa, no trabalho, na escola, online e offline, reflete santidade. Somos constantemente desafiados a tomar a decisão certa que nos levará ao reino da santidade, da distinção e da singularidade. 

Na brachá (benção) da havdalá, no fim do Shabat, refletimos sobre o poder divino de separar e diferenciar entre o kodesh e o chol, e então aprendemos mais sobre esse conceito tão interessante. Kodesh é entendido como algum estado oposto a chol. Chol significa comum, ordinário. Os dias da semana não tem uma diferença significativa entre eles, uma 2ª feira e uma 4ª feira podem ser facilmente confundidas. Já o Shabat é único, diferenciado dos demais dias da semana. O oposto da santidade é o mundano, o comum, o ordinário. Portanto, estamos sendo chamados, especialmente esta semana, a ser extra-ordinários.

Assim como Deus é extraordinário, nós devemos emular esse aspecto divino em nossas próprias vidas. Uma aspiração de expressar o mais alto potencial que temos por termos sido criados à imagem de Deus. O caminho para alcançar isso é descrito na parashá desta semana. A Torá enumera muitas mitzvot (mandamentos) que são bein adam lechavero — entre uma pessoa e seu semelhante. Essas mitzvot concentram-se em uma ideia principal, a famosa regra de ouro: “Tratem as outras pessoas da mesma maneira que gostariam de ser tratados por elas.”

“Não roubem; não neguem uns aos outros”, “Não jurem falsamente”, “O salário de um trabalhador não ficará com vocês até a manhã seguinte”, “Não odeiem seu irmão em seu coração” e, no final desta seção, lemos: “Ame o seu próximo como a si mesmo” (Vaicrá 19:18). Esta frase vem ao final da sequência de mandamentos “negativos”, coisas que não devemos fazer, de forma positiva, dando-nos o resumo e a orientação de como cumprir como cada um deles. Amor e compaixão são as chaves para encontrar a santidade, o elemento extraordinário na comunidade.

Que possamos encontrar o que é sagrado em nossas vidas, ser cada um de nós um pouco extraordinário, colocando em ação esses valores e práticas em nossa comunidade. Que possamos continuar espalhando amor, gentileza e compaixão uns aos outros enquanto caminhamos juntos por esse caminho desconhecido.


Shabat shalom

Rabino Natan Freller