Onde começa a reza? Em quais circunstâncias? Com quais objetivos? Essas são perguntas fascinantes e imprescindíveis para qualquer abordagem séria à tradição judaica. O judaísmo inclui conceitos de Deus e da relação entre o humano e o divino, inúmeras práticas religiosas repletas de rezas e bênçãos.

A reza é o resultado da proximidade com o divino? Rezar é ter intimidade com Deus? Qual é o propósito da reza? Informar a Deus nossas necessidades? Expressar nossas sensações? E em quais circunstâncias? Quando estamos bem e seguros, ou quando sentimos fragilidade? E qual o objetivo? Pedir, agradecer, refletir?

De onde vêm as rezas do ponto de vista histórico? Deus as mandou, ou são obra humana? E, se são obra humana, quem as escreveu? Quando? E com qual autoridade?

A parashá da semana tem a primeira insinuação de uma reza, segundo os autores da maioria delas. O rei Avimelech tomou-a — ou sequestrou-a — uma vez que Avraham declarou que se tratava de sua irmã, para evitar o risco de ser morto pela sua beleza. Em seguida, o texto conta que Avimelech fica doente “pelo assunto de Sarai”. A palavra “assunto”, “davar”, significa “fala”, “palavra”. Os sábios do Talmud, autores da maioria de nossas rezas, dizem que Sarai rezou no palácio de Avimelech reclamando a Deus pela injusta incerteza de sua situação.

São os mesmos autores das rezas que, em outra passagem, atribuem a origem da reza a outra mulher segregada socialmente, e a outra reclamação de justiça social e de gênero: Chana, mãe do profeta Samuel. 

(Que irônico resulta observar que, ainda nos nossos dias, o lugar da mulher na reza em muitas sinagogas é questionado, enquanto os autores delas, todos homens, insistiram em atribuí-las a mulheres em posturas femininas militantes!) 

A rabina Aviva Richman do Instituto (ortodoxo moderno) Hadar, de Nova Iorque, sugere que a reza não necessariamente surge da certeza da intimidade com Deus. Pelo contrário, ela surge como a fé: da incerteza, do mergulho no desconhecido. Reza-se para se conhecer, se ouvir e se expressar. É a partir dessa postura, acrescento eu, que podemos adquirir uma perspectiva divina e transformadora. A reza não é palavra divina nem resolução teológica, e sim expressão ou ousadia humana em busca de mais e melhor.

 

Shabat Shalom,

Rabino Ruben Sternschein