A cada sexta-feira à noite o kidúsh é recitado sobre uma taça de vinho, momentos antes da refeição festiva de shabat. Kidúsh significa santificação e é uma das mitsvót relacionadas a este dia sagrado: em Ex 20:8, lemos: “Lembre-se do dia de shabat para santificá-lo”. Através do kidúsh nós cumprimos este mandamento.

O texto do kidúsh se refere ao shabat como “Zicarón LeMaassê Bereshít” (“recordação da obra da criação”), “Zéḥer Litsiát Mitsráim” (“lembrança da saída do Egito”) e “Yom Teḥilá LeMicraêi Códesh” (“o primeiro dos dias de santa convocação”).

Zicarón LeMaassê Bereshít”, conforme está escrito: “Ele descansou no sétimo dia de toda a obra que havia criado. E Deus abençoou o sétimo dia e o santificou, porque neste dia ele interrompeu toda Sua obra que havia criado e realizado” (Gn 2:2-3). Este é um shabat “cósmico”, o shabat divino, cuja lembrança evoca que este dia é sagrado por si só e independe de qualquer ação do ser humano.

Já em Ex 20:8-11, lemos: “Lembre-se do dia de shabat para santificá-lo. Por seis dias trabalhe e faça todas as suas obras criativas/criadoras. O sétimo dia será Shabat para o Eterno seu Deus, e você não fará obras como essas (…). Pois em seis dias Deus criou os céus e a terra, o mar e tudo o que eles contêm, descansando no sétimo dia”.

Neste segundo trecho, o shabat “terrestre” é santificado justamente através da ação humana. Ao imitar seu Criador, refreando-se das obras criadoras/criativas/transformadoras, o ser humano se eleva em espiritualidade, torna-se mais próximo da Divindade e santifica o sétimo dia exatamente como Deus o santificou.

Zéḥer Litsiát Mitsráim”, conforme está escrito: “Guarde o dia de Shabat para santificá-lo (…) você não fará qualquer atividade criativa/criadora; nem você, nem seu filho, nem sua filha, nem seu servo, nem sua serva (…), para que seu servo e sua serva descansem, assim como você. Para que você se lembre que foi escravo na terra do Egito, e que Deus o tirou de lá (…). E foi por isso que o Eterno seu Deus ordenou que você fizesse o Shabat” (Dt 5:12-15).

Neste terceiro trecho, o Shabat deixa de ser somente uma questão espiritual e religiosa. Guardar o Shabat passa a ser um compromisso ético do ser humano para com seu semelhante, além de ser um compromisso com Deus. O descanso deixa de ser apenas em nível pessoal e passa ao campo social: TODOS devem descansar. Fomos libertados, mas não temos liberdade para negar ao outro o direito ao descanso, pois isso o desumanizaria.

Por fim, na parashá dessa semana, Emór, nós lemos “Yom Teḥilá LeMicraêi Códesh”. No capítulo 23 somos apresentados novamente aos dias sagrados (as santas convocações), os dias de descanso e recordação, dias de nos elevar em nossa espiritualidade.

Os sábios chamam a atenção para o fato de que a Torá, a cada vez que fala sobre esses dias, apresenta o shabat em primeiro lugar (“Yom Teḥilá”). Para eles, o texto demonstra que esse dia é hierarquicamente superior às outras “Micraêi Códesh”, sendo sagrado entre os sagrados.

O shabat é nossa oportunidade semanal de exercitar nossa espiritualidade, de estabelecer contato com o Divino, encontrar nossos semelhantes, [re]encontrar nossa liberdade. Que a cada semana o shabat nos inspire a aproveitar melhor essa oportunidade de elevação no primeiro dos dias sagrados.

 

Shabat shalom.

Moré Theo Hotz