O que é magia? Quem acredita na magia?

Segundo os dicionários, a magia é uma arte ou ciência oculta que produz efeitos contrários à natureza, ou ao esperado e conhecido. No sentido figurado, usamos essa palavra para conquistas inimagináveis, para algo fascinante e atraente.

A magia é ligada a bruxos e seres imaginados, a fantasias, e geralmente a tendências primitivas a ilusões e a enganos. Supomos que os povos menos evoluídos atribuíam à magia todo fenômeno natural cuja regra desconheciam, e que também acreditavam que os bruxos ou magos podiam forçar os deuses a realizar os efeitos desejados.

Nos nossos tempos, de um lado existem religiões e religiosidades que continuam se relacionando com o mundo e com as divindades, como se fossem efeitos separados de leis. Do outro, existem tendências que se distanciam das religiões justamente por acreditar que essas crenças devem ser rejeitadas. Os primeiros dizem “não acredito nas bruxas, mas sei que existem”. Os segundos dizem: “como a fé significa acreditar em magias antinaturais e em seres inexistentes que agem por caprichos ou forçados por nossos rituais, eu não sou religioso”.

A parashá da semana nos oferece uma terceira alternativa.

O patriarca Jacó começa sua jornada solitária de amadurecimento e aperfeiçoamento batendo (dando de cara) num “local” (Gênesis 28:11). Lá, vê o sol se pondo e sonha com a famosa escada cujos pés se firmaram à terra e seu topo alcançava o céu, pela qual sobem e descem anjos. No sonho, ele ouve uma promessa divina de segurança e prosperidade. Ao acordar, diz para si: ”eis que neste local há Deus e eu não sabia”. E promete: “se Deus me cuidar e prosperar com pão para comer e roupa para vestir,  devolverei um dízimo”. Em seguida, ele recolhe suas pernas e as eleva para se dirigir a seu destino.

Ao longo dos séculos, foram apontadas as seguintes reflexões no midrash:

  1. Uma vez que Deus é nomeado também como local ou lugar (“makom”) assume-se que Jacó esbarrou em Deus. Deu de cara com Ele. Pois rezar nada mais é do que bater e chacoalhar. 
  2. O pôr-do-sol pode se relacionar com a situação de angústia, fraqueza/força e dúvida/mistério de Jacó. 
  3. Os anjos vão da terra para o céu e não vice-versa. Não são seres imaginários ou fictícios. Se formam e se transformam em função do que realizam na Terra.
  4. Jacó condiciona o cumprimento da promessa divina ( “se Deus cuidar de mim…”) pois nada é garantido mesmo tendo sido dito por Deus, uma vez que até Deus dependeria de que Jacó se faça merecedor do cumprimento da promessa.
  5. O Divino pode estar presente mas depende de saber vê-lo.
  6. O contato com o divino não substitui a ação humana. Pelo contrário, a inspira e a propicia com maior força. 

Às vezes rezamos para pedir que Deus faça por nós. Como magia. Outras, não rezamos porque acreditamos que nada e ninguém pode nos substituir, que toda magia é engano, ilusão e primitivismo. A parashá nos propõe que a magia religiosa é a capacidade de olhar para tudo como se tivesse um potencial e um sentido maior, que caberá a nós desvendar e desenvolver. Ao invés de ver em tudo um milagre alheio e alienador, ou ver apenas o imediato, trata-se  de se atrever a se desafiar para além do visto na primeira e mais superficial impressão. Querer ver mais seria a chave para chegar mais longe, mais profundo e mais alto. 

 

Shabat Shalom,

Rabino Ruben Sternschein