Parashat Ki Tetsê – Lágrimas

Mudanças drásticas em nossas vidas nos levam a refletir, a ponderar, a questionar, a duvidar. Por mais pensadas que possam ser essas mudanças, quando elas chegam, nos desestabilizam. Ainda mais, aquelas que vêm de repente, sem nenhum aviso, estas podem nos tirar o chão.
Existem pessoas que encaram melhor essas mudanças do que outras, são aquelas que vêm todas as novas oportunidades quando a vida muda de rumo. Outras já são mais resistentes têm medo do desconhecido e buscam o conforto do passado. No entanto, a maioria das situações vem para ficar, e talvez até para mudarem novamente no futuro.
Essas mudanças podem ser tão significativas que nos levam às lágrimas. Lágrimas de alegria, tristeza, confusão, medo e de tantas outras emoções que seria impossível enumerar. Às vezes temos vergonha destas lágrimas, quando as mudanças aparentemente são “para melhor”, mas não temos vergonha quando são lágrimas de sofrimento pela perda de algo ou alguém. São justamente as lágrimas as que têm o poder de nos ajustar no novo caminho.
A Torá nos remete a guerras e espólios de guerra, inclusive humanos. Isto pode parecer fora do caminho justo e humanizado que esperamos que a Torá apresente sempre, e seja exemplo a ser seguido. Precisamos nos lembrar que as guerras existem no mundo, queiramos ou não. Se fôssemos o tempo todo passivos, possivelmente não estaríamos mais aqui para contar essa história. No entanto, nossa parashá traz que, inclusive no momento de guerra, a obrigação é de sermos humanos.
Quando uma moça era levada como espólio de guerra para se casar com alguém, ela tinha o direito de chorar durante todo um mês por sua família antes de entrar nesse novo mundo, nessa nova família, nesta nova vida, ela não terá mais contato com sua família de origem, de repente. Ela tem o direito de passar por esse luto, por seu passado e por seu futuro.
Chorar um choro que lave a alma, que desembaça a visão, que purifica. Essa moça, aparentemente não tem escolha. Não pode voltar à sua casa, à sua vida anterior. Isso não quer dizer que o que a espera é ruim mas significa mudança e para poder transitar de um estágio ao outro ela chora.
Do outro lado, o homem que a capturou para ser sua esposa observa. Vê com seus próprios olhos o impacto que está deixando nela, mas também está estabelecendo respeito, mostrando a ela que, apesar de espólio de guerra e cativa, é também um ser humano, com sentimentos e emoções (lembrando que poucas vezes o casamento era considerado um ato de amor até poucos anos atrás).
Nós, assim como ela, levamos um tempo para reajustarmos em relação às mudanças, piores ou melhores. Mas se reprimirmos essas lágrimas, talvez nunca consigamos ver o bom do futuro, porque mesmo as piores mudanças podem nos dar oportunidades de alcançarmos algo positivo.
Não tenhamos vergonha de nenhuma de nossas lágrimas porque elas podem, literalmente, limpar nossos olhos para ver e fazer um futuro diferente. Choremos de tristeza e de alegria, de dor e de amor, de cansaço e de euforia
Shabat Shalom
Rabina Fernanda Tomchinsky-Galanternik