No Shabat passado eu fiz alguns comentários na minha prédica que se conectam também com a parashá desta semana, mas de uma forma diferente. Falei das confissões pessoais do Cohen Gadol, reconhecendo que eles também cometem erros, pecam e não são perfeitos. Falei da mitsvá de amar não só aqueles que são parecidos conosco, próximos a nós, mas também ao estrangeiro que mora em nossas terras.

Na tradição de nosso povo, o amor é muitas vezes entendido como ações, mais que como um sentimento, ou um sentimento que leva inevitavelmente a ações de bem, de cuidado, de solidariedade, de apoio, acolhimento da pessoa amada.

A santidade tem a ver com separação, divisão, diferenciação. Deus santificou o Shabat e, assim, o diferencia do resto dos dias da semana.

Parashat Emór também lida com o tema da santidade, neste caso dos Cohanim, na listagem das comemorações bíblicas, os tempos que o povo de Israel santificara pelas gerações.

Santificar o tempo está, na minha opinião, no coração da nossa tradição e central na vida do nosso povo, na sua continuidade, evolução, compreensão do mundo, prática de valores e criação de rituais. Santificar pessoas estabelecendo hierarquias entre seres humanos é um conceito, para mim, difícil de aceitar e se contradiz com muito com o que eu acredito, valorizo e admiro em nossa tradição. Os seres humanos foram criados à imagem e semelhança de Deus. A busca pela equidade deve ser contínua, a compreensão de que diversidade e pluralidade é uma bênção, uma oportunidade de crescimento, um fato no mundo e tem que estar presente em nossas mentes e nossos corações e nossas ações. Todos e todas nós, em nossa versão física que transita este mundo, somos imperfeitos e imperfeitas. Perfeita é só a Divindade, o mundo, e nós como parte dele aspiramos a melhorar, conquistar nossa melhor versão. “Santos sereis” diz a parashá da semana passada.

Assim está escrito:

“O Eterno disse ainda a Moisés: ‘Fale a Aarão e diga: Nenhum homem da sua descendência ao longo das gerações que tiver um defeito será indicado para oferecer o alimento de seu Deus. Absolutamente ninguém que tiver um defeito será indicado: nenhum homem que for cego, ou manco, ou que tiver um membro muito curto ou muito longo; nenhum homem que tiver uma perna quebrada ou um braço quebrado; ou for corcunda, ou anão, ou tiver uma protuberância em seu olho, ou que tiver cicatriz, ou escorbuto ou testículos esmagados. Nenhum homem entre os descendentes de Aarão, o sacerdote, que tiver um defeito será indicado para fazer a oferta de fogo para o Eterno; se tiver um defeito não será indicado para oferecer comida ao seu Deus. Ele pode comer da comida de seu Deus, da santíssima assim como da santa; mas não entrará atrás da cortina ou se aproximará do altar, pois tem um defeito. Ele não profanará esses lugares para Mim. Porque Eu, o Eterno, os santifico’. Assim Moisés falou a Aarão e seus filhos e a todos os israelitas.” (Lev 21:16-24)

Assim fala Deus dos seus filhos? Pode Deus ser preconceituoso? Não somos todos criados à imagem e semelhança? O amor divino não é incondicional? Somos só aquilo o que se vê? Moshe tinha dificuldade na fala e ninguém esteve mais perto da presença divina do que ele. 

Volto ao começo das minhas palavras para santificar o tempo que passou que permite a evolução, a mudança, a luta pelos direitos de todos e todas, a compreensão da diferença entre igualdade e equidade e a necessidade de lidar com nossos preconceitos. Reconheço a imperfeição de nosso mundo e sou grata por viver em tempos que somos cientes das conquistas já alcançadas e do trabalho que ainda temos por fazer. Que alcancemos os dias que santificar tenha a ver com união, que o amor seja incondicional e que as portas de nossos santuários estejam realmente abertas para acolher a todos e todas. Nas palavras do Rabino Sydney Greenberg z”l:

“Que a porta desta sinagoga seja larga o suficiente para receber todos os que têm fome de amor, todos os que se sentem solitários e desejam companhia.
Que ela acolha todos aqueles que têm preocupações a descarregar, graças a exprimir e esperanças a nutrir.
Que a porta desta sinagoga seja estreita o suficiente para impedir a entrada da mesquinhez e da soberba, da inveja e inimizade.
Que seu limiar não seja um obstáculo escorregadio para os pés jovens ou perdidos.
Que ela seja alta demais para admitir a condescendência, o egoísmo e a dureza.
Que esta sinagoga seja, para todos os que nela entrarem, a porta de entrada para uma vida mais frutífera e significativa.”

Shabat Shalom,

Rabina Tamara Schagas

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